quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Jamais saberei...



Foi numa tarde dessas, de por-do-sol-perfeito.
Eu passava de um lado para o outro da avenida, pela passarela. Ponte sobre um rio veloz, cheio de luzes e sons ininterruptos, próprios das cidades quando cai o lusco-fusco do dia e da jornada diária. Era então, aquele momento em que não é dia nem noite, que ainda resta alguma luz, tênue e opaca, como um véu. Eu seguia na passarela tendo algumas pessoas na minha frente, feito rumo, bússola de quem só vai seguindo, deixando o fluxo humano levar. As vezes é bom... às vezes é num momento assim que ocorre a magia. E ocorreu.
Quando uma dessas pessoas se deslocou para a direita, à minha frente, vi uma moça de camiseta regata e short, tatuagem nas costas, atrás do ombro direito. O que era mesmo o desenho? Precisei esperar outra mudança no fluxo humano e lá estava: um olho chorando.
Fiquei alguns minutos fixando aquela imagem estranha. Não era um símbolo místico ou religioso como o olho de Órus, o deus egípcio; também não era o “olho que tudo vê”, aquele que se encontra sobre uma pirâmide nas notas de dólar e na simbologia maçônica.
Era um olho simples, com três ou quatro gotas a escorrer numa fileirinha. Tatuagem mixuruca - diga-se de passagem - podia muito bem ser apenas um desenho tosco de criança. Mas que impacto me causou!
Tenho um péssimo hábito, um dom, um sei-lá-o-que que me faz viajar nessas coisas. E lá fiquei pensando enquanto andava atrás da moça, e depois, e até hoje: porque alguém tatuaria um olho chorando nas costas? Por que, meus deuses, por que?
Foi um motivo triste? Parece, já que o olho está chorando. Mas, esse momento um dia passaria, será que a moça não levou isso em conta ao eternizar essa tristeza? Aí, me deparei com a possibilidade de ser uma tristeza que não passa! Uma morte, será? Alguém como uma mãe ou um pai, ou ainda um amor que ela perdeu para a senhora da foice? Realmente triste...
A verdade é que jamais saberei. A moça desceu a passarela, virou para a esquerda e adentrou o shopping Center aparentemente feliz, com seu shortinho jeans e regata, como se a tatuagem nem mesmo existisse. Aquela tristeza por certo só era lembrada por quem a via pelas costas, ou ela mesma forçando a visão num espelho. É... talvez seja uma boa maneira de lidar com a tristeza...

Um comentário:

  1. Muito show o texto... daria roteiro para um videoclip...interessante que hoje me deparei com o tal olho de hórus pelo menos umas duas vezes... agora foi a terceira... LEGAL!

    JOPZ

    ResponderExcluir